Camillo, estou ciente de que nesse mesmo instante estão ocorrendo tantas coisas, mas apesar de reconhecer isso, meus sentidos não são suficientes para captar em completude a vastidão da singularidade <em visão micro e macro> do que tem ocorrido para além da minha cabeça
Só que eu percebi, Camillo, eu percebi...
agora esse é um ponto muito claro dentro do conjunto de pensamentos que me sacode os nervos do despertar ao adormecer, sim está nítido
eu percebi que o que mais nos atormenta é a possibilidade de estar perdendo possibilidades
associada à vaga e iludida impressão de que temos domínio quanto a isso
Entendo, Camillo, e até concordo em partes, mas não, nem em relação aos nossos pensamentos poderemos utilizar a acepção desta palavra, pois não dominamos
Não temos o controle sobre todas as variáveis, nem mesmo conhecemos todas as variáveis
Estamos, em verdade, dançando com cada um desses pensamentos, eles nos oferecem a mão e nós permitimos a dança, rodamos, rodamos e rodamos nesse salão que é nossa mente
E nesse momento estabeleceremos sinapses, as quais serão chamadas de "passado" pela intensidade com que ocorrem e permanecem,
enquanto nós continuarmos aceitando seus convites para mais uma dança,
pois quando não mais, elas esvanecem feito como quando sopramos sementes de dente-de-leão.
Por vezes, abandonando para sempre o salão.
Então, posso recusar estoicamente a mão estendida desse pensamento que me faz pensar, de acordo com a medida dele, que não estou vivendo de maneira suficiente
que eu deixei passar, que eu estou deixando passar e que eu não passarei
Dançar com esse pensamento só me faz girar em torno de mim mesma,
e por quanto tempo poderei suportar esse giro sem sentir meu estômago enjoar?
por quanto tempo poderei suportar esse giro sem perder o equilíbrio no salão?
E a consequência dessa vertigem me induz a ver e a pensar que as coisas a minha volta estão fora do lugar, mas elas não estão senão em mim, tonta de tanto girar com ele
Se o passado é uma rede de sinapses que eu sustento, impressões minhas de uma experiência que vivi
se o futuro é somente o lampejo contextualizado da visão projetada e baseada na conclusão que tenho sobre tudo o que acho de insuficiente em mim
Camillo, Camillo, Camillo... a possibilidade de ser só pode existir na confluência e sincronicidade de todas infinitas e incógnitas variáveis no agora
E tudo, tudo além do agora são, e somente são, especulações minhas durante a dança
em um salão cujo chão quadriculado possui 64 casas, 32 quadrados pretos e 32 brancos
especulações baseadas nas impressões do que eu já vivi (sinapses) e do que penso em viver (necessidades minhas)
Projeções de um enxadrista que conhece o tabuleiro, conhece as peças, mas desconhece completamente a visão de seu oponente, o destino de todas as coisas
Por isso, Camillo, só agora eu compreendo que
eu estou vivendo tudo o que deveria estar vivendo, nada além disso e nada menos que isso, justamente porque aqui estou na espontaneidade do agora
Não existe "e se" no agora e é isso que faz dele verdadeiro
Gosto de ouvir em 4:44 quando viram a página, tornam o momento mais próximo a mim